Tambores para a rainha da floresta: a inserção da umbanda no Santo Daime
por JUNIOR, Antonio Marques Alves em
« Voltar
A presença da Umbanda dentro do Santo Daime, verificada no conjunto de preceitos e ritos que compõem a cosmovisão daimista, adquiriu visibilidade a partir dos anos oitenta, no bojo da expansão que levou esta religião para fora dos limites da floresta amazônica. Sob o comando de Sebastião Mota de Melo, o Santo Daime testemunhou o crescimento da importância da Umbanda em sua constelação doutrinária, a ponto de distinguir-se por ela no conjunto das religiões ayahuasqueiras, entre as quais aquelas derivadas da criação do Mestre Irineu. Na geração que corresponde à liderança do Padrinho Sebastião, um conjunto de ocorrências precipitou os elementos dispersos, mas presentes, que permitiram a recepção da Umbanda. A primeira delas resulta do impacto da chegada de um macumbeiro que fascinou a jovem comunidade daimista e seu líder espiritual com suas performances tão familiares ao nosso meio: consultas, advertências, demandas e espetáculo. Interpretava-se nos acontecimentos um embate entre as forças da Verdade e as falanges do Mal, ali representada pelo Rei dos Exus, o Tranca Rua, que ao final, sob a luz da bebida sagrada, firmou um pacto com o Santo Daime: o de ser seu defensor contra os espíritos das trevas. Imprimia-se, ainda que sem nome, o ethos umbandista no imaginário da comunidade. Os anos finais do Padrinho Sebastião foram concomitantes ao grande crescimento do Santo Daime, particularmente na cidade do Rio de Janeiro. Impregnados pelas perspectivas da cultura alternativa, que parecia fazer o elo entre a religião da mítica Floresta e a exótica Umbanda, encontraram-se a Umbanda e o Santo Daime nas pessoas de seu padrinho e de uma mãe-de-santo carioca, à frente de um grupo de discípulos que se aproximava do Santo Daime. Alguns destes discípulos viriam a cumprir papel fundamental na formatação dos ritos que expressaram esta aliança. O papel do sucessor do Padrinho Sebastião, Alfredo Gregório de Melo, seu filho, foi o de reconhecer a demanda, talvez irresistível, da Umbanda e expressá-la na criação de novos rituais, oficializando, por assim dizer, aquela inserção e presença, e a posicionando mais próxima do centro de sua floresta de crenças.